Médicos Sem Fronteiras criticam política da UE para imigrantes e impacto dos nacionalismos
Os Médicos Sem Fronteiras (MSF) estão preocupados com o impacto dos nacionalismos na solidariedade internacional e criticaram a política da UE para os imigrantes, que reduz a empatia dos europeus para com o mundo.
“A política da UE contra os migrantes é particularmente tóxica e concebida para causar danos” a médio-prazo na forma como os europeus lidam com os estrangeiros, afirmou à Lusa Javid Abdelmoneim, que está em Lisboa para participar na Websummit.
O médico e dirigente dos MSF lamenta em particular a ação do Reino Unido ao procurar limitar o asilo e transferir os imigrantes para outros países, violando “as convenções que o próprio país assinou”.
Por isso é que os MSF desenvolveram projetos na Europa para mitigar “os danos e os problemas de saúde infligidos por essas políticas repressivas”, com apoio à saúde mental, além das questões puramente físicas.
E nesses projetos no Reino Unido, Javid Abdelmoneim sentiu o egoísmo dos seus compatriotas, ouvindo queixas sobre o modo como os MSF gastavam o dinheiro das doações.
“Eu dou-vos dinheiro para ajudar as pessoas que precisam dele e não para estes que não deveriam estar aqui”, recordou, como exemplo.
Em entrevista à Lusa, o britânico admitiu que as organizações não-governamentais dependem de “mecanismos globais” promovidos pelos governos nacionais.
O “direito dos refugiados, o direito à livre expressão, o direito humanitário, os direitos humanos ou os movimentos migratório estão todos a ser corroídos em tempo real”, explicou o médico, conhecido apresentador da televisão britânica em cenários de conflito.
“Cada vez mais o nosso trabalho é uma consequência das violações desses direitos”, disse.
Mas o mesmo também se passa na Europa, que tem decidido colocar fora do continente os mecanismos de receção de imigrantes, numa “onda anti-imigrante e anti-estrangeiro que ganhou a opinião pública eleitoral”.
O “espírito do tempo mudou e hoje é isolacionista, anti-estrangeiro”, quando o que são precisos “mecanismos multilaterais”, que estão em crise, acrescentou.
“Não quero pintar um quadro demasiado negativo”, mas, por exemplo, com a crise causada pelo vírus do Ébola há 10 anos, “havia uma indiferença grosseira” que ignorava o trabalho no terreno, mas não o prejudicava.
“O que tenho visto é que a diferença está no tipo de indiferença. A indiferença é quase neutra, mas agora é quase um sentimento do tipo ‘mantenha-os fora’ daqui”, uma espécie de rejeição ativa de quem vivem com problemas, explicou Javid Abdelmoneim.
Em Gaza, disse, assiste-se a uma “hipocrisia descarada e uma clara duplicidade de critérios”, em que a “ordem baseada nas regras do mundo dos EUA está a quebrar todas as regras”.
Por outro lado, “nos locais onde trabalhei, na Ucrânia, na Etiópia ou no Sudão, há cada vez mais solidariedade, comunidades de base lideradas e impulsionadas por agentes humanitários”, que podem construir estratégias para “garantir a segurança alimentar e humanitária” às populações locais.
O “mundo mudou”, disse. Quem dantes era mais solidário com as causas globais tornou-se mais nacionalista e as comunidades locais, anteriormente isolacionistas, “tornaram-se mais solidárias”.
Na Websummit, Javid Abdelmoneim falou sobre a importância da tecnologia para a saúde em geral e para os MSF em particular.
“Precisamos de ser mais eficientes e mais eficazes com os nossos recursos e, se a tecnologia pode ajudar nisso, então sim, é excelente”, seja no apoio logístico às operações humanitárias ou no combate às doenças.
“Estamos a utilizar a Inteligência Artificial agora para prever a modelação de doenças epidémicas com um pequeno algoritmo muito interessante para proteger-nos das epidemias de malária”, exemplificou.
Outro caminho da tecnologia é o combate às “infeções com antibióticos direcionados”, bem como o apoio remoto de especialistas, disse ainda Javid Abdelmoneim.
Fonte: Economico – Politica
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